DESABAFO DE UM IDOSO
Ainda me lembro da infância.
Acredite, ainda me lembro.
Me recordo o dia em que olhei para o alto e me perguntei
Como serei quando tiver 80 anos?
E aqui estou eu...
A dúvida se foi e deu lugar a uma dura realidade:
Esta sou eu com 80 anos.
O tempo passou rápido,
as crianças cresceram e hoje são elas quem cuidam de mim.
Não me amam como antes,eu sinto.
Tento,mas é inútil minha boca já não consegue mais dizer te amo.
Ela nem se mexe... Meus braços que antes os carregavam no colo,
hoje já não têm forças nem para dar um abraço.
Não enxergo como antes,mas quem faria questão de passar todo o tempo olhando este teto branco?
As vezes sinto vontade de chorar de tristeza por passar dias sozinha,
mas não tenho lágrimas.
Sinto vontade de gritar de felicidade quando vejo alguém,
mas permaneço a mesma, imóvel e sem voz.
Filho,eu queria tanto poder te agradecer,mas não posso.
Você acha que minha mente também debilitou-se com o tempo,
mas nunca estive tão lúcida.
Amo receber visitas,reconheço a voz e o cheiro de cada um.
Obrigada por me trocar querido.
Sinto muita vergonha,mas é muito ruim ficar suja.
Não gosto de ficar nesta posição e essa frauda me incomoda tanto...
Sinto tanta vontade de sair.
Ver um lugar diferente,pessoas diferentes,sentir o ar ver o verde.
Minha comida preferida,há muitos anos não a como.
Já nem me lembro do gosto.
Você não sabe,mas eu não estou surda,pode conversar.
Eu queria tanto ouvir sua voz,saber como você está.
Mas você entra,eu sinto,e não diz nada.
Como está o mundo aí fora? Como é o mundo aí fora?
Eu não consigo mais dizer,
mas eu te amo como sempre te amei,muito,incondicionalmente.
A culpa disso não é sua,mas também não é minha.
Somos humanos,nascemos, crescemos e morremos.
Embora respire eu já estou morta há muito tempo.
Boa sorte querido!
AUTOR:Guilherme Givisiez
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